
Assistir ao remake de Vale Tudo na Globo tem se tornado um exercício de paciência e, mais recentemente, de frustração. Se antes a maior dificuldade era descobrir a que horas a novela começaria, agora há um novo problema: os episódios estão cada vez mais curtos, cortados, picotados. A sensação é que estamos vendo pedaços soltos de uma grande obra, como se fosse uma colagem apressada de cenas que lembram vagamente a novela original, mas sem o impacto, o ritmo ou a densidade que a consagraram.
Metade da dificuldade continua sendo, sim, a flutuação constante de horário. Há dias em que a novela começa antes das 21h20, outros em que atrasa, e quando a gente tenta confiar em alguma lógica, lá está ela terminando de forma abrupta. Não há consistência assim. Vale Tudo é como um livro dos classicos da Literatura. Não dá para virarmos as páginas de forma tão apressada. E além de não sabermos quando começa e quando termina, o capítulo de hoje (14) foi tão fragmentado, que já não é possível se conectar à trama como se deve.
A impressão que fica é que, entre futebol, jornal e reality show, Vale Tudo virou um tapa-buraco de luxo. Uma obra-prima da dramaturgia brasileira, tratada como conteúdo de enfeite, empurrada em horários incertos e com episódios mutilados. Onde está o respeito pela história, pelas atuações, pela construção narrativa? Tudo parece jogado às pressas, desidratado. A novela está deixando de ser um mergulho no passado para se tornar uma lembrança distorcida, um reflexo pálido do que foi. Eu lamento profundamente. Até semana passada, ainda nutria esperanças.
Mas, depois de hoje, o que antes era só irritação com o horário, virou decepção com o conteúdo. Porque não é apenas uma questão de perder capítulos por flutuação — é a perda da própria experiência de ver uma novela. Uma história que deveria envolver, criar tensão e comover está sendo servida em fragmentos, picadinhas, como se o telespectador fosse incapaz de acompanhar um arco dramático com começo, meio e fim. É frustrante, é triste e, acima de tudo, desrespeitoso.
A Globo falha duplamente: na organização da grade e na preservação da qualidade de um clássico. O que poderia ser uma oportunidade de revisitar uma novela histórica com entusiasmo está se transformando em mais um motivo de dor de cabeça. Basta ler a quantidade de críticas publicadas somente hoje, no dia do trágico capítulo super sônico. Para quem queria reviver Vale Tudo com paixão, começa a pairar um sentimento amargo de desilusão com a emissora, com o projeto, e com o jeito apressado de tratar o que deveria ser tratado como patrimônio.