
A fuga de Carla Zambelli, após ser condenada a 10 anos de prisão, é a síntese perfeita do fracasso do sistema de justiça brasileiro. Durante anos, investigações, delações, perícias, recursos e manobras processuais criaram uma longa encenação jurídica. Mas, quando finalmente se ouviu o veredito, a personagem principal já não esta mais no palco. Esse roteiro repetido transforma cada operação policial em espetáculo midiático, mas sem clímax real: não há punição, não há reparação, não há justiça de fato.
O caso Zambelli expõe o velho defeito estrutural da justiça brasileira: ela é lenta, ineficiente e, acima de tudo, incapaz de cumprir a sua função mais elementar, que é garantir que a punição alcance os culpados. A demora não é fruto apenas da burocracia; é um projeto de poder, um sistema que opera para proteger quem está no topo. No fim, o que sobra é a sensação de impunidade generalizada. Ninguém mais acredita, por exemplo, que Jair Bolsonaro um dia será preso, mesmo diante das inúmeras acusações que se avolumam contra ele. A justiça brasileira nunca chega a tempo, ou não quer chegar, ou não foi feita para chegar.
Esse descrédito não nasce apenas da lentidão, mas da cumplicidade silenciosa das instituições. Quando uma figura pública como Zambelli foge do país mesmo depois de condenada, fica claro que as autoridades permitiram, direta ou indiretamente, que isso acontecesse. Não foi uma fuga cinematográfica; foi, como sempre, uma fuga protocolar, se bobear, com direito a passagens e tempo de sobra para comprar e planejar a fuga confortavelmente. Mais uma vez, o Estado brasileiro mostrou que não só investiga e julga tarde demais, como também não prende quando deve. A justiça, nesse país, é como um porteiro distraído: está sempre lá, mas nunca impede ninguém de sair.
Carla Zambelli é quem dá a banana na novela da vida real. Ao deixar o Brasil após ser condenada, repetiu a célebre cena final de Vale Tudo, em que Marco Aurélio, interpretado por Reginaldo Faria, foge impunemente e, antes de embarcar para o exterior, dá uma banana para o Brasil. A analogia é inevitável: assim como na novela, as falhas das intituições brasileiras não soam como um crime também, mas um elemento estrutural, um vício nacional, uma marca da nossa identidade política. A diferença é que, na ficção, a cena gerou indignação e debate; na vida real, ela provoca apenas o cansaço melancólico de quem já viu esse filme, ou essa novela, muitas vezes.