
Que experiência! Sentado na poltrona envolvente, o público é imediatamente submerso na atmosfera densa da peça “A Baleia”. A caracterização, com próteses faciais, enchimento realista e até quatro quilos de bolsas de gelo constrói um corpo imenso e pulsante, jogado entre desconforto e autenticidade . José de Abreu, em cena, não interpreta apenas um homem obeso e doente: ele nos devolve a visão de um ser humano à deriva, tão palpável que chega a ferir a alma. A nossa alma! Cada respiração, cada suspiro, é carregado de vida e exaustão.
O que mais me impressionou, no entanto, não é apenas a fisicalidade impactante, mas a imersão emocional. Antes de assistir, li diversas críticas destacando que José de Abreu fez “sua maior imersão em 58 anos de teatro”. Não posso falar de uma forma completa sobre a experiência de José de Abreu no palco, nem me atraveria dado a grandiosidade do seu talento. Mas posso falar da minha com o teatro. Vi um personagem quitando mágoas e feridas com um comprometimento que me pegou além da técnica: uma performance visceral, que pulsou das entranhas ao silêncio da cadeira que eu sentava, em todo ambiente onde o drama se concentrava.
A direção sensível de Luís Artur Nunes e a adaptação fiel ao tom original do texto de Samuel D. Hunter garantiram o espaço ideal para essa interpretação colossal . O resultado? Um espetáculo que vai além de uma narrativa de obesidade ou morte. É uma meditação poderosa sobre culpa, reconciliação e amor paterno. Como observou outro colega da imprensa, “A Baleia mergulha no oceano da reconciliação extraindo colossal atuação de José de Abreu.
Deixei a peça, inevitavelmente, impactado. É raro vivenciar no teatro uma sensação tão crua e plena. A peça não é apenas necessária; é urgente. Estava ali para assistir, mas a peça me obrigou a sentir. E, ao final, resta a certeza: José de Abreu alcança uma atuação que se firma entre as mais memoráveis do teatro brasileiro: generosa, dolorosa, redentora. Viva o teatro brasileiro!