
A premiação de Ainda Estou Aqui como Melhor Filme Internacional no Oscar não é apenas um triunfo cinematográfico, mas um marco histórico para a memória nacional. Se por muitas décadas o Brasil demonstrou uma dolorosa tendência ao esquecimento, o mundo agora se encarrega de lembrar. A cinebiografia de Rubens Paiva, brilhantemente conduzida por Walter Salles, não só revive uma das páginas mais sombrias de nossa história, mas a projeta em escala global, garantindo que a verdade não seja mais silenciada, nem aqui, nem lá fora.
Ao dar vida à trajetória de Rubens Paiva, um dos símbolos da repressão e da luta pela democracia no Brasil, o filme rompe o véu de descaso que por tanto tempo encobriu esse capítulo. Mais do que um relato cinematográfico, Ainda Estou Aqui é uma contundente denúncia, um testemunho que resiste ao tempo e à conveniência política. A vitória na maior premiação do cinema mundial confere ao Brasil o reconhecimento que, ironicamente, muitos de seus próprios cidadãos 'patriotas' ainda relutam em conceder.
A importância desse filme transcende a arte e se inscreve na esfera do compromisso histórico. Em tempos de narrativas revisionistas e de tentativas de relativização do passado, Ainda Estou Aqui se impõe como um manifesto visual contra a amnésia coletiva. Se a história nos ensina algo, é que a desmemória é um terreno fértil para a repetição dos erros. Ao revisitar a tragédia de Rubens Paiva, o filme ergue um escudo contra a repetição dos horrores do autoritarismo.
Para o Brasil, o Oscar de Ainda Estou Aqui não é apenas um troféu na prateleira do cinema nacional, mas um atestado de que sua história já não pode ser ignorada. O mundo agora sabe, e esse conhecimento traz consequências. Se antes a repressão se esgueirava sob o manto do esquecimento, agora ela se vê exposta à luz da consciência global. E o que um país ganha quando sua verdade é reconhecida internacionalmente? Ganha, acima de tudo, a impossibilidade de fingir que nada aconteceu.
E se o filme recebeu a estatueta, Fernanda Torres recebeu algo que talvez seja ainda maior: a consagração moral. Mesmo sem levar o Oscar de Melhor Atriz, sua interpretação se tornou um marco, um daqueles raros momentos em que a arte e a história se fundem para criar algo inesquecível. No imaginário global, não há dúvidas: a melhor atuação do ano pertence a ela. Seu trabalho ultrapassou os limites do reconhecimento formal e alcançou a eternidade da memória coletiva.
Assim, um Brasil de Marias, silenciadas pela história, acorda agora como um Brasil de Fernandas, imortalizado pelo talento. E, mais do que nunca, a frase do título ecoa como um símbolo de transformação: a memória desperta, a história se reafirma, e o cinema prova que o esquecimento já não é mais uma opção.