Alessandro Lo-Bianco

Um 'Encontro' entre a dor de um pai destroçado e o espetáculo

O limite ético da imprensa foi rompido em rede nacional, e a audiência não pode ser justificativa para tamanha insensibilidade

Patrícia Poeta
Foto: Reprodução/TV Globo
Patrícia Poeta


Hoje o dia amanheceu com uma mancha na imprensa brasileira ocasionada pela exploração da dor alheia no Encontro com Patrícia Poetado programa Encontro. O programa ultrapassou qualquer limite aceitável de ética jornalística e humanidade. Diante de milhões de espectadores, um pai destroçado recebeu, sem qualquer preparo, informações cruciais sobre o assassinato de sua filha – antes mesmo de serem comunicadas oficialmente pela polícia. Uma revelação feita ao vivo, sem qualquer cuidado ou respeito pelo sofrimento de quem estava ali.

A busca por audiência nunca pode justificar a espetacularização da dor. O jornalismo tem um compromisso não apenas com a verdade, mas com a dignidade das vítimas e de seus familiares. Há um motivo para que autoridades sigam protocolos ao dar esse tipo de notícia: o impacto psicológico pode ser devastador. No entanto, um programa matinal, que deveria prezar pelo acolhimento e pela sensibilidade, escolheu ignorar esse princípio básico e transformar uma tragédia pessoal em um show ao vivo.

É inadmissível que um veículo de comunicação com tamanha influência como a TV Globo trate um momento tão delicado como se fosse mero entretenimento. O que aconteceu no Encontro não foi jornalismo. Foi um espetáculo de insensibilidade. Um espetáculo em que o sofrimento de um pai foi exposto sem qualquer filtro, sem qualquer consideração por sua fragilidade emocional.

Esse episódio deveria servir de alerta: a busca pelo impacto não pode ultrapassar a linha da decência. A dor não é um produto, e a audiência não pode ser conquistada à custa do sofrimento de pessoas que, naquele momento, precisam de acolhimento, não de câmeras em seus rostos enquanto processam uma notícia devastadora sobre uma filha.

Que essa indignação coletiva não se dissipe com o passar dos dias. Que o caso gere reflexão e mudanças. Porque, se a imprensa continuar a tratar tragédias como espetáculos, não estaremos mais informando – estaremos apenas lucrando com a desgraça alheia.