Alessandro Lo-Bianco

O curral da vergonha

Reality se torna um zoológico de impulsos durante festa, e atração musical paga o preço do constrangimento.

Adriane Galisteu em 'A Fazenda 17'
Foto: Reprodução/ Record TV
Adriane Galisteu em 'A Fazenda 17'

A noite de ontem em A Fazenda foi o retrato mais fiel da ruína moral de participantes que perderam o senso, a moral, a elegância e o mínimo de respeito pelo telespectador. No meio da apresentação do grupo Pixote, um símbolo de nossa música popular, com décadas de estrada e dignidade artística, o que se viu foi uma plateia de confinados incapazes de distinguir festa de surto, convivência de histeria. Era como assistir a um banquete servido aos porcos: um espetáculo de som, luz e talento sendo engolido por gritos, empurrões e vaidades sem controle.

O que mais choca é perceber o quanto o nível despencou entre as mulheres dessa edição. Ray, Carol, Martina, Thamiris e outras transformaram o jogo em um ringue de egos frágeis e emoções sem filtro, e o resultado é uma sequência de cenas que não provocam mais entretenimento, mas vergonha. Já não há sutileza, estratégia ou carisma: apenas um desfile de ofensas, choros performáticos e alianças que duram menos que uma música do Pixote. O público, antes cúmplice da trama, agora assiste com o mesmo desconforto de quem presencia uma discussão de bar às três da manhã.


Martina, em especial, simboliza o problema maior: o da dissimulação premiada. Sua conduta é um laboratório de manipulação emocional, mentiras, acusações criminosas, e uma mistura de vitimismo e frieza que irrita até os mais pacientes. A energia na casa chegou a um ponto que parece se alimentar desse tipo de comportamento que adoece o ambiente e expulsa a inteligência do jogo.

Há algo de cruel em ver a edição se transformando, no que poderia ser um experimento humano, em um circo psicológico onde o mais fingido vence. O telespectador sente-se usado, exaurido, insultado. O reality que deveria mostrar “a vida como ela é” hoje exibe apenas o ser humano reduzido ao instinto, à gritaria, à falta de compostura. Não são pessoas em busca de um prêmio; são animais testando limites de convivência, arrastando o programa para o esgoto da vulgaridade. E o público, esse ainda civilizado, segura o controle remoto com a tentação crescente de quem segura, mas tem, talvez, medo de perder a própria sanidade.

Entretenimento, com desordem e autenticidade com degradação, talvez a melhor atitude seja o silêncio. Porque há um ponto em que a crítica se cansa, a audiência se ofende e a dignidade se levanta da poltrona. E eu, que tanto defendo e amo os realities, confesso: tá puxado! Porque o que se viu ontem não foi um reality show: foi o colapso da decência televisionada.