
Há um momento na carreira de qualquer jornalista em que a repetição exaustiva se torna não apenas cansativa, mas quase ofensiva à própria profissão. E eu cheguei lá. Confesso: já deu. Não aguento mais falar de Virgínia. Qualquer coisa que ela posta: um pum, uma tosse, um passo, um story vira manchete, vira “tendência”, vira uma pauta que nos é empurrada goela abaixo. O jornalismo, que deveria buscar relevância, se vê capturado pelo algoritmo e pela audiência fácil, e nós, jornalistas, acabamos reféns dessa engrenagem que transforma o óbvio em espetáculo.
O fenômeno Virgínia é menos sobre ela e mais sobre o sistema que a retroalimenta. Não se trata de demonizar a influenciadora, mas de expor o vazio que a cerca. Há uma distância abissal entre a construção de uma figura midiática como ela e o prestígio orgânico de uma Gisele Bündchen, por exemplo, que alcançou relevância global por mérito, impacto cultural e consistência profissional. No entanto, insistem em dar a Virgínia um pedestal que simplesmente não existe. É a glamourização da 'tigresa', um conteúdo que, se fosse analisado sem filtros, seria reconhecido pelo que verdadeiramente é: superficialidade editada.
Mas o problema se torna maior quando entendemos que esse movimento midiático diz mais sobre o país do que sobre a influenciadora. Quando um país reserva sua atenção máxima a figuras cuja profundidade é mínima, estamos diante de um sintoma social evidente: a fome por distração venceu a fome por reflexão. E, nesse cenário, a mídia, ansiosa por cliques, empurra o trivial como se fosse relevante. O resultado? A mediocridade vira pauta diária, enquanto debates urgentes ficam relegados ao rodapé invisível da timeline, mesmo no campo das celebridades, universo tão vasto.
Há também um desgaste emocional e intelectual para quem trabalha nesse ofício. Produzir jornalismo sobre nada, dia após dia, é um teste de paciência que compromete a dignidade de quem acredita no poder da informação. Viramos cronistas do vazio. Mediadores de uma cultura que transforma banalidades em acontecimentos. E é impossível não se perguntar: qual é o impacto disso na formação do imaginário coletivo? Que país estamos ajudando a construir quando dedicamos manchetes a pequenos gestos fabricados enquanto ignoramos narrativas que realmente importam?
É por isso que digo, com toda a clareza: já deu, embora entenda que meu grito é solitário. Não é sobre não gostar de Virgínia. É sobre não aceitar que a nossa profissão seja reduzida ao tamanho de um story. O Brasil das celebridades merece mais: mais profundidade, mais crítica, mais jornalismo e menos espuma. Enquanto continuarmos elevando a superficialidade ao status de fenômeno nacional, não haverá algoritmo capaz de nos salvar de nós mesmos.