Paolla Oliveira como Helena em 'Vale Tudo'
Reprodução TV Globo - 7.4.2025
Paolla Oliveira como Helena em 'Vale Tudo'


No drama refinado de Vale Tudo, entre escândalos e vilanias memoráveis, há uma história que pulsa em silêncio, comovendo quem sabe olhar: o núcleo de Heleninha, Ivan e a família Roitman. Heleninha é uma mulher doce, mas dilacerada, marcada por recaídas, sob a sombra de um pai inexistente, uma elite moralista e uma mãe sem noção. Quando Ivan se aproxima, a relação entre os dois carrega a ternura de uma esperança, mas também o fardo brutal de uma expectativa que milhares de pessoas vivem, ou já viveram fora da televisão. Ivan não pode ficar apenas com Heleninha. Ele é atraído por toda a família também para uma missão: a de salvá-la. E, por extensão, salvar toda a estrutura falida e silenciosamente abusiva da família dela.

A família Roitman não pede ajuda explicitamente. Mas cobra. Cobra com olhares, com ausências, com elogios rasos ao “bom moço que está ajudando a Heleninha a voltar a ser ela mesma”. Assim como em muitas famílias oportunistas, Ivan também não é visto como um ser humano, mas como um funcionário emocional que vai salvar a vida daquela gente, em partes. E isso é mais comum do que parece. Quantos de nós já entramos em relacionamentos assim, achando que estávamos vivendo algo com uma pessoa, quando, na verdade, estávamos sendo contratados, inconscientemente, para dar conta de uma história que começou muito antes da nossa chegada na vida daquela pessoa?


Heleninha, por sua vez, também é vítima. Embora uma vítima de araque nessa versão horrorosa de Vale Tudo. Mas, no cotidiano fora da TV, o traço é o mesmo: ela tenta ser leve, mas é esmagada por seu passado e pela idealização do que Ivan representaria em sua vida. Ao invés de parceiro, ele se torna o esteio. Mas ninguém aguenta sustentar o outro sozinho. Amar alguém não é apresentar soluções, não é ter sempre as palavras certas, nem fazer milagres na vida do outro e de seus familiares. E, acima de tudo, não é emprego. Quando o amor vira desempenho, a relação vira dívida. E quem ama se sente exausto por estar sempre devendo algo que nunca vai conseguir pagar. Uma aposentadoria definitiva, financeira e emocional.

Vale Tudo revela, nesse núcleo silencioso e pungente, que às vezes o que destrói uma relação não é a falta de sentimento: é o excesso de expectativa. O amor precisa de presença, não de sacrifício. De acolhimento, não de currículo. Talvez Ivan tenha percebido isso tarde demais. Bem feito, porque também não vale grandes coisas. Mas, ainda sobre a vida real, talvez muitos de nós só percebamos quando já estamos curvados pelo piano nas costas, perguntando: quando foi que amar virou carregar?

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