Tiago em Vale Tudo
Reproduçao TV Globo
Tiago em Vale Tudo


Ao colocar o filho de Heleninha usando saia nos capítulos recentes da nova versão de Vale Tudo, Manuela Dias tenta lançar luz sobre a discussão de gênero e liberdade de expressão no vestir, um tema necessário, mas que, em 2025, já não causa estranhamento, muito menos reflexão. A intenção é nobre, e a cena está longe de ser ofensiva ou caricata. No entanto, o gesto revela mais sobre a tentativa de parecer contemporânea do que sobre uma real sintonia com o que hoje realmente move os debates sociais. O que poderia ser um gesto potente de provocação e ruptura, ou uma pauta melhor para gerar um debate mais importante em meio a uma temática tão rica da novela, isso soa mais como tentativa de atualizar o que, na prática, já não é tabu há pelo menos quatro anos.

Desde 2020, meninos de saia passaram a circular com naturalidade em escolas, redes sociais e até no tapete vermelho. Ícones da música pop, filhos de celebridades e jovens anônimos já discutem, há anos, o rompimento entre vestimenta e identidade de gênero, sem que isso precise, necessariamente, estar ligado à orientação sexual. Essa geração já compreende a moda como linguagem, e o uso da saia por meninos deixou de ser “transgressor” para ser, simplesmente, uma escolha. Quando Manuela tenta inserir essa pauta como se estivesse abrindo os olhos da sociedade, ela apenas repete, com atraso, o que já está consolidado em boa parte dos lares urbanos e das redes.


A novela, que deveria provocar a sociedade como fez em 1988, se contenta com uma sensação de modernidade tardia. E esse não é um caso isolado. Vale Tudo já ensaiou outros debates contemporâneos, como não ter vontade de sexo, um assunto batido e amplamente discutido há algumas edições pelo Big Brother Brasil. O feminismo em vozes frágeis ou até mesmo questões raciais são importantes, mas também sempre de forma superficial e rarefeita, sem reverberação fora da bolha da novela.

A adaptação parece acreditar que a simples inserção de um tema basta para provocar o debate, mas esquece que timing, profundidade e impacto são ingredientes essenciais para que a ficção dialogue com a realidade. Minha percepção, no fim, é um retrato de intenções que não se cumprem.

A nova Vale Tudo se esforça para parecer uma obra antenada, mas segue repetindo fórmulas que não cutucam, não desafiam, não incomodam e, por isso, não transformam. A saia do menino é apenas mais uma peça de figurino: simbólica, mas inócua. O Brasil de 2025 já está em outro capítulo.

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