
O que era para ser um momento de seriedade e responsabilização virou um espetáculo vergonhoso e irresponsável. Rico Melquiades, um dos influenciadores mais associados à promoção das plataformas de apostas, e que já debochou de pessoas que perdem neste tipo de jogo, compareceu à CPI das Bets nesta terça-feira e protagonizou uma das cenas mais constrangedoras da comissão até agora. Diante de parlamentares e da transmissão ao vivo para todo o país, Rico resolveu abrir o celular e jogar o famigerado “jogo do tigrinho”, a pedido dos parlamentares, para mostrar como funcionava e ainda teve a “sorte” de ganhar R$120 ali, na frente de todos. O que deveria ser um alerta virou propaganda. A sessão, que deveria investigar danos, terminou alimentando ainda mais o sistema que se propõe a combater.
Essa atitude expôs não só o despreparo de quem deveria estar ali para se explicar, mas também o risco de transformar uma CPI em um palco de autopromoção involuntária. Em vez de responder às perguntas com a seriedade que o tema exige, Rico se calou em diversos momentos. Demonstrou ao vivo como é possível ganhar dinheiro com o vício — justamente o ponto mais crítico da discussão. Enquanto o povo perde tudo, ele ganha ao vivo na TV. E a comissão assistiu passivamente a uma cena que escancarou o tamanho do problema: as apostas se tornaram tão banalizadas que nem mesmo diante de uma investigação federal o influenciador demonstrou algum pudor entre o perder e o ganhar.
A verdade é que, sobre as Bets, Rico nunca teve muito o que dizer, e agora, ao que parece, também não quer. Suas respostas evasivas e silêncios constrangedores só reforçam a culpa que não se assume com palavras, mas que se confessa com atitudes. Se há algo que ficou claro neste depoimento, é que quem lucra com o vício alheio prefere jogar do que prestar contas. O circo de ontem com Virgínia, somado ao espetáculo de hoje com Rico, compõe o retrato fiel de quem trata a CPI como plateia, não como investigação.
Mais revoltante ainda é o contraste entre essa ostentação pública e a realidade da população. Rico, que recentemente adquiriu uma mansão luxuosa, não explicou de onde vem tanto dinheiro, mas o povo sabe. É dinheiro de aposta. Prêmio de A Fazenda não compra tanto. Dinheiro de gente endividada, de jovens iludidos, de famílias destruídas. O ganho de R$ 120 em rede nacional não foi apenas uma demonstração; foi um deboche. Um tapa na cara de quem perdeu tudo acreditando em promessas vendidas por influenciadores que hoje se escondem atrás de silêncios ou fazem piada da dor alheia.
O episódio escancara a urgência de responsabilização e regulação. Não dá mais para tratar essas figuras como meros “criadores de conteúdo”. São cúmplices de uma engrenagem de exploração disfarçada de diversão. E se Rico Melquiades não se perdeu apenas no silêncio, mas também no espetáculo, a comissão precisa reencontrar o foco. O povo não quer mais ver influenciador jogando. Quer ver justiça sendo feita.