Alessandro Lo-Bianco

O alcoolismo de Heleninha não comove porque é raso demais

Vale Tudo: não é por falta de preparo do telespectador, mas porque a novela não mergulha na complexidade do alcoolismo

Paola Oliveira não colou como Heleninha
Foto: Reprodução/Instagram
Paola Oliveira não colou como Heleninha


Não adianta espernear. Nao adianta culpar o público por falta de maturidade ou sensibilidade. Isso é um erro. Quando uma novela aborda um tema tão delicado e urgente como o alcoolismo, espera-se profundidade, impacto e identificação. Não foi isso que vimos na nova versão de Vale Tudo. A personagem Heleninha, interpretada por uma atriz competente, sofre de alcoolismo, mas tudo parece girar em torno da sua relação doentia e narcisista com Ivan, e não da sua doença em si. O vício surge como pano de fundo emocional, quase um detalhe e o resultado é uma trama que não toca o público como deveria a partir deste mote.

Basta lembrar como foi arrebatadora a repercussão quando Vera Holtz interpretou uma alcoólatra em Mulheres Apaixonadas. O Brasil parou. Famílias discutiam o tema, a imprensa se mobilizou, o drama virou espelho para milhares de lares. Isso não acontece agora. Não porque o público não é capaz de se sensibilizar com um rico em sofrimento, como alguns sugerem, mas porque a novela não entrega as camadas reais dessa dor. Faltam as consequências, os conflitos, as rupturas familiares causadas pela dependência com profundidade. Nessa trama, o vício pelo álcool vira apenas um detalhe num roteiro tão raso.


As sessões de terapia de Heleninha, por exemplo, são frias, calculistas, mal encaixadas, e estão prestando um desserviço a classe dos terapeutas. Servem mais para ilustrar uma tentativa de solução do que para escancarar o problema. Não vemos a doença afetar seu entorno de forma crua e realista. Cadê a tensão com a família? Onde está o desgaste emocional dos que convivem com ela? Onde está o colapso físico, social, afetivo? O alcoolismo não está na superfície. E o roteiro insiste em tratá-lo como se estivesse.

É um erro grave, e é da autora. Manuela Dias, conhecida por tramas ambiciosas, desta vez optou por uma condução rasa, onde o alcoolismo parece estar ali apenas para justificar a fragilidade de uma mulher, não para dar protagonismo a um drama real que mata milhares de brasileiros todos os anos. A história de Heleninha poderia ser um dos grandes motores da novela, mas se perde numa abordagem tímida, quase ornamental. O público não engole. E com razão.

Jamais! Não podemos culpar o público por não se identificar. O público está pronto, sim. O que ele rejeitam e com razão, é uma narrativa que promete profundidade e entrega esboços. A falta de comoção diante do drama de Heleninha não é um sintoma de insensibilidade coletiva, mas um reflexo direto da superficialidade com que o tema vem sendo tratado. Quando o roteiro falha, não há empatia que resista.