Luciano Huck
Reprodução/TV Globo
Luciano Huck

No domingo, durante o encerramento do Domingão com Huck, Luciano Huck fez mais do que um desabafo: ele apresentou um diagnóstico e uma proposta de política pública. Ao lamentar que “o mesmo modelo de segurança pública se repete há décadas, sem resultado” e ressaltar que “120 mortos numa operação policial no Complexo do Alemão e da Penha” significam “120 mães que enterraram seus filhos”, ele trouxe à tona o que muitos evitam ver: o Estado fora das comunidades, a presença do crime como substituto, e a falência de um ciclo apenas repressivo. 

Huck acerta ao colocar a interação entre três níveis de poder: municipal, estadual e federal, como central para resolver o problema. Ele afirma: “É preciso coordenar ações entre todos os níveis de poder. É preciso sufocar a parte financeira das organizações criminosas … É preciso gerar oportunidade …”  Ao falar de um conceito que os cientistas políticam chamam dentro das salas de aula de “governança multinível”, e os desafios de instituições que só aplicam a força, mas não constroem pertencimento, ele acerta ao lembrar que as comunidades onde a polícia age são habitadas primeiro por vítimas do abandono institucional, logo, a repressão unilateral não resolve. É matemático. Ponto.

Os ataques a Huck, que o acusam de “defender bandidos”, de “romantizar o crime” ou de desrespeitar as forças de segurança, falham por não encarar, ou não querer mesmo entender a integralidade do que ele disse. Embora ele reconheça o valor da polícia (“eu nunca escondi a minha posição pública de apoio à polícia… formada por policiais bem treinados, respeitados pela corporação e pela população”), ele também afirma que “quando o Estado se ausenta, outro poder ocupa esse lugar”.  O contraditório foi bem apontado: criticou-se o tiro quando se falta absoluta limpidez na vela: a simplificação do discurso dele na boca dos opositores  ignora por completo que Huck pede mais e melhor policiamento, não sua supressão.

Huck aponta a necessidade de, no mínimo, combinar repressão com promoção de oportunidades. E é exatamente isso que todas as teoria de segurança pública moderna, em qualquer parte de sucesso no mundo, aponta: além do uso legítimo da força, é necessário atacar raízes, financiamento e influências simbólicas. Quando ele diz: “dar perspectiva para quem nasce nesses recortes da cidade … oferecer boas referências, abrir caminhos”  ele negocia com a ideia de que segurança não é só ausência de crime, mas presença do Estado, dos direitos, da cidadania. E isso se chama 'oportunidades.' E reconhecer isso não é “romantizar bandido”; é reconhecer que os traficantes, milicianos e o crime se alimentam de lacunas do Estado.

Na minha humilde opinião, Huck está certo ao destacar que a população das favelas e periferias não escolheu a violência, mas vive sob ela: “Vale lembrar que a enorme maioria da população carioca vive nesses cantos da cidade e é também refém dessa violência. Não compactuam, não pertencem.”  Ao humanizar as vítimas e ao chamar a sociedade a enxergar que o verdadeiro lucro da criminalidade não está onde suas metralhadoras brilham, ele fala sobre uma mudança estrutural, ética e institucional, e não apenas de violentas e letais operações policiais.

Se a segurança pública no Rio seguirá a mesma lógica de sempre: prisões, mortes, elogios aos ‘heróis’ e invisibilidade das causas, então esse discurso será apenas mais um eco. Mas se entendermos que Huck propôs algo diferente: Estado que aparece na periferia com esporte, lazer, cultura e geração de renda, talvés seja a primeira vez que o tráfico passará a ganhar o maior inimigo de todos. E aí, quem sabe, a polícia que protege, realmente passará a proteger comunidades que respiram de verdade. Huck não falou mal de nenhuma opinião divergente, ele apenas apontou o único caminho.

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